Recentemente foram publicadas duas normas que atualizaram o regramento de conhecidos produtos de previdência privada do mercado brasileiro: o PGBL e o VGBL. Além disso, trouxeram novidades para o investidor de longo prazo.
O primeiro, com quase 20 anos de criação, voltado para pessoas que declaram o Imposto de Renda no formulário simplificado e que são vinculadas a algum regime de previdência social, trouxe naquela época maior estabilidade para as seguradoras e entidades abertas que, até então, trabalhavam com produtos que garantiam rentabilidade.
Seus antecessores, que traziam consigo anexas promessas de pagamento de IGPM + 6% mesmo na fase de acumulação (viáveis em um período de características econômicas bem diferentes da revolução causada pelo Plano Real), foram substituídos pelo Plano Gerador de Benefício Livre, que dava ao investidor a rentabilidade obtida pelo Fundo – positiva ou negativa, mas diminuindo o risco de crédito da seguradora ou entidade.
O segundo, VGBL, que ainda não atingiu sua maioridade no mercado, pois foi criado em 2002, foi a tábua de salvação para atingir a grande maioria do público que hoje investe na previdência privada: pessoas que não necessariamente se encaixam no perfil do PGBL (grande parcela que declara Imposto de Renda no formulário simplificado), ou que excedem os limites legais estabelecidos para poderem gozar das vantagens fiscais que o seu par proporciona.
O VGBL, que veio travestido de “seguro”, acabou ganhando tanta expressividade que hoje representa mais de 90% do setor e acaba cumprindo outras funções, muitas das quais, não raro são controversos, tais como “blindagem” de patrimônio e planejamento sucessório.
Mas uma questão é inegável: tanto Ps quanto Vs, ou ainda os outros planos da família de um de outro (os tais PRGPS, PRSAs, PAGPs, PRIs, VRGPS, VRSAs, VAGPs, VRIs) cumprem relevantíssima função no momento atual: as gerações cuja expectativa de vida cresce em progressão constante necessitam de mecanismos de proteção financeira.
As normas recentemente publicadas, duas Resoluções do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), nº 348 e 349 incrementaram a sopa de letras já existente: agora, há também o PGBL Programado, que oferece a possibilidade de contratação, durante o período de diferimento, de pagamentos financeiros programados, e o PDR, que apresenta, na fase de acumulação, garantia mínima de desempenho, e a reversão, parcial ou total, de resultados financeiros. Para cada P, ainda, há um plano V espelho: VGBL Programado e VDR.
As resoluções inovaram ainda em pelo menos dois pontos relevantes para os poupadores de longo prazo: houve a inclusão do conceito de participante qualificado, abrangendo investidores profissionais, ou seja, pessoas com investimentos superiores a um milhão de reais, ou aprovadas em exames de qualificação técnica, ou clubes de investimento, observados os requisitos estabelecidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Era comum haver o pleito por um tratamento diferenciado de tais categorias, o que, com a inclusão feita, ficará mais atrativo para esse grupo.
Em segundo lugar, outro aspecto que pode aproximar os investidores dos planos de previdência privada é a possibilidade que se abriu de transformação de parte da reserva acumulada em renda ou pagamentos financeiros programados em função da expectativa de vida do participante. Antes, se o participante optasse pela conversão da sua reserva em renda e falecesse sem escolher pela reversão dessa renda a um beneficiário, nenhum valor seria devido aos seus herdeiros. Isso acabava fazendo com que as pessoas usassem os planos de previdência privada mais como poupanças do que “previdências”. Com essa novidade, o plano adquire um caráter “misto”, atendendo ambas as finalidades.
A Mãe Previdência Social brasileira dá sinais de doença. Às vezes, manca. Há quem diga que rasteja, não salta mais. A Mãe Canguru talvez não tenha condições de sustentar filhos que trabalham dos 20 até os 60 e, resistentes, podem viver até os 110, irrompendo a lógica dos números, até mesmo para os maiores especialistas em finanças.
Ainda há muito a ser feito: mais do que criação de produtos ou inclusão de novas letras nessa sopa. Há mais de década aguardamos a chegada de um tal de “VGBL saúde”. Sonhamos com uma tabela regressiva de Imposto de Renda que chegue até a alíquota zero. Pleiteamos a isenção do ITCMD em todos os Estados, sempre que o plano de previdência privada for utilizado com sua verdadeira finalidade social – sem distorção do sentido.
Mas se espera que a publicação das novas normas atraia investidores, atenda a alguns daqueles antigos anseios e sirva de estímulo para o fortalecimento do setor. Por meio de um mercado sólido e com produtos atraentes, alguns dos filhos supercentenários carentes poderão assinar sua declaração de independência, ao invés de continuarem carregados no marsúpio da Mãe Previdência Social doente.
Ivy Cassa – advogada, sócia na Petraroli Advogados Associados
Fonte: jornal Valor Econômico